Breve Introdução: Deus e o Raciocínio Lógico

 


Deus e o homem existem em níveis metafísicos distintos. À diferença entre esses níveis Van Til chamou de "distinção Criador-criatura". Esta distinção manifesta-se também na natureza do conhecimento de Deus e na natureza do conhecimento do homem. 


Van Til sustentou que o pensamento de Deus é dotado de coerência perfeita. Deus não age ilogicamente nem existe n'Ele qualquer incoerência. Para que os homens conheçam os fatos, então, eles também devem pensar coerentemente e com consistência lógica. "A lei da não-contradição, portanto, como a conhecemos, é a expressão em nível criado da coerência interna da natureza de Deus", escreveu Van Til. "Os cristãos devem empregar a lei da não-contradição, seja positivamente ou negativamente, como um meio pelo qual sistematizar os fatos da revelação, sejam esses fatos encontrados no universo em geral ou nas Escrituras". [Bahnsen, 268.]


Diferentemente do não-Cristão, o cristão vê a lógica como um reflexo do pensamento de Deus, em vez de vê-la como um conjunto de leis ou princípio que são "mais elevados" do que Deus ou que existem independentemente d'Ele. Não existe uma lei impessoal e abstrata da lógica que dite a Deus o que ele pode ou não pode dizer ou fazer. "As restrições lógicas do pensamento de Deus são as restrições de Sua própria natureza pessoal, que o homem deve imitar". [Ibid.] Isto significa que, no caso do estudo das Escrituras, por exemplo, o homem deve utilizar seu raciocínio lógico para interpretá-las, pensando os pensamentos de Deus (logicamente ordenados) para interpretar os pensamentos de Deus (revelados nas Escrituras). O homem deve utilizar seus dons de raciocínio lógico e empírico para conhecer os fatos da realidade criada. 

Não obstante, as Escrituras não podem ser objeto de crítica ou rejeição com base em uma lógica supostamente superior ao próprio Deus. A Palavra de Deus é a juíza para a determinação da verdade, em vez da mente do homem. Por esta razão temos dificuldade para conciliar os conceitos de pré-ordenação divina e liberdade humana. A Escritura afirma as duas coisas, e cremos que nelas não há contradição real (na mente de Deus), mas elas parecem paradoxais. A coerência lógica eterna de Deus é mais perspícua e adequada do que a nossa. "O que é misterioso para nossa visão e pensamento limitados é perfeitamente claro e harmonioso em Seu pensamento". [Ibid. 267]

Deus criou a mente humana para funcionar em subordinação à mente de Deus. A mente humana não foi criada para julgar Deus ou duvidar de sua existência. E é exatamente isto que os não-cristãos fazem por causa do pecado.  Embora as leis da lógica sejam as mesmas para cristãos e não-cristãos, ambos têm diferentes concepções a respeito delas. O não-cristão utilizará as leis da lógica para julgar se Deus existe ou se Sua Palavra é ou não verdadeira ou coerente.

A partir disto, podemos perceber que cristãos e não-cristãos possuem uma desavença sobre a visão fundamental da realidade. Quando o homem busca ser religiosamente "neutro" em sua metodologia, ele está dizendo que as leis da lógica não têm necessariamente seu fundamento em Deus. Isto significa que o não-Cristão pressupõe o Acaso como metafisicamente último ("ultimado", "final" ou "supremo"). Para Van Til, este é o caminho para o ceticismo e o relativismo. Em última instância, o não-cristão se compromete com um universo misterioso.

Em contraste, o cristão sustenta que o universo é essencialmente racional, porque Deus é racional. Ao utilizar seu raciocínio lógico, o homem está buscando pensar os pensamentos de Deus depois d'Ele mesmo quando investiga e reflete sobre o mundo natural, eventos históricos, ordem social, arte, etc. Isto não significa, porém, que o ser humano tem conhecimento exaustivo de nada. Para Van Til, o conhecimento do homem é sempre limitado em seu nível criatural, quando comparado com o pensamento exaustivo de Deus. 


"Embora a palavra de Deus revele mistérios profundos que nos deixam com dificuldades conceituais – e que parecem contraditórias – porque, como seres humanos, não podemos explicar completamente a relação do infinito com o finito, Van Til sustentava firme e claramente que “a fé abomina o realmente contraditório; manter o realmente contraditório é negar Deus... [Temos] o direito e a coragem de dizer que o cristianismo não contradiz as leis da lógica. . . . [Estamos certos] que o cristianismo é objetivamente válido e que é a única posição racional para o homem manter.'' Em outro ponto, Van Til declarou muito claramente: “O cristão descobre, além disso, que a lógica concorda com a história [bíblica]. A lógica humana concorda com a história, porque deriva seu significado da história .'' [ibid. 269.]


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