VAN TIL: Distintas filosofias dos fatos.

A epistemologia van tiliana é uma consequência das doutrinas reformadas de Deus. Em outras palavras, o Deus cristão é tão radicalmente superior aos deuses dos teísmos genéricos que não há outra alternativa senão considerá-lO como a base mesma da possibilidade de todo o conhecimento.


O Deus cristão é o único Ser auto-consciente, onisciente e criador (e conhecedor) de todos os fatos. O Criador da fé cristã é absoluto e a fonte de todo ser finito e conhecimento. 


Um cristão e um não-cristão podem reconhecer, por exemplo, uma xícara de café. Eles podem igualmente beber o café enquanto debatem sobre cristianismo e ateísmo. Mas esta aparente concordância esconde uma pressuposição básica e profunda que revela a antítese radical entre as duas visões de mundo, cristã e não-cristã.


Para o cristão, a xícara de café existe como um "fato criado" por Deus. O material que compõe a xícara foi criado por Deus do nada. As leis físico-químicas mantém a xícara em forma de xícara. A xícara não vai evaporar ou liquefazer-se. A xícara ainda foi esmaltada e forjada por ação humana com a utilização de sua razão e o desenvolvimento de técnica e tradição. A razão humana e sua criatividade, bem como a sensibilidade com que o ser humano enfeita uma pequena xícara são assim porque Deus criou-o como Imago Dei. O ser humano é criado por Deus; o espaço em que nos sentamos para beber o café foi criado por Deus; o tempo de que necessitamos para ingerir a bebida foi criado por Deus; as leis da física que mantém uma uniformidade da realidade, idem. Importa saber que absolutamente todas as causas e condições necessárias para a experiência que temos com xícaras encontram sua causa primeira em Deus e seu propósito. Antes de o ser humano inventar xícaras, Deus sabia o que xícaras de café são desde antes da fundação do mundo. De fato, todos os "fatos da realidade" encontram sua existência e seu sentido em Deus.


Ora, como dito, um não-cristão poderá sentar-se conosco para beber uma xícara de café. Contudo, ao contrário do cristão, o não-cristão tem pressuposições antitéticas àquela do cristão. A xícara, como todos os outros fatos da realidade, existem em um universo incriado e fruto do acaso. O ser humano existe por causa do acaso evolucionário depois de milhões de anos de seleção natural. As leis físico-químicas que o não-cristão reconhece existir também existem por puro acaso. Todo "fato" da realidade, incluindo a xícara, é fruto do mais puro acaso. Pode ser na verdade que nem exista tal coisa como "natureza universal de xícara". O que chamamos de xícara nada mais é do que um amontoado de átomos aos quais o ser humano arbitrariamente dá um sentido que é necessariamente subjetivo e conveniente. Ademais, todo "fato da realidade", para o descrente, não sendo criado, é "auto-existente". Isto que chamamos de realidade não tem causa e é puramente acidental.  


Enquanto bebem e elogiam a qualidade do café que bebem na xícara durante o debate, a simples concordância superficial sobre o fato da xícara esconde na verdade pressuposições impossíveis de serem sintetizadas: ou a xícara é um fato criado por Deus ou a xícara é um fato não-criado, auto-existente. É impossível encontrar um meio-termo entre um "fato criado"(pressuposição cristã) e um "fato incriado"(pressuposição anti-cristã).


A controvérsia levantada pela apologética van tiliana (que Oliphint chama de "Apologética Pactual") começa quando, ao reconhecer a necessidade de uma metafísica e de uma cosmovisão que sirvam como BASE para a epistemologia, a escola de Apologética Pactualista denuncia a impossibilidade de neutralidade pressuposicional no uso da razão humana. 


Se o Deus cristão é o verdadeiro, Ele não pode senão ser a base para todos os fatos e para o conhecimento humano possível destes mesmos fatos. Para Van Til, se cremos no Deus da Bíblia, somos obrigados a vê-lo como a condição e a fonte para o próprio conhecimento.


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