Falsa Neutralidade e Razão Autônoma

Por autonomia epistemológica os van tilianos se referem à [suposta] "habilidade de obter conhecimento independente da Revelação e da Existência de Deus". Esse termo não se limita apenas às injustificadas presunções de conhecimento de um ateu, mas a toda epistemologia que começa de um ponto agnóstico. O indivíduo acredita que pode encontrar a verdade através de seus próprios esforços, explorando, analisando e explanando conforme sua lógica, sem precisar de Deus como referência, mesmo que ele não negue a possibilidade da existência de Deus. Ele começa a partir de si mesmo, dependendo tão somente de suas próprias habilidades, acreditando analisar a realidade sem julgamentos apriorísticos e de forma supostamente neutra.


Epistemologias autônomas tornaram-se de tal forma onipresentes que são confundidas mesmo com a condição ''sine qua non'' para o pensamento racional em si. Mesmo o cristão, quando vai para as ciências, acaba sendo obrigado a deixar suas pressuposições com o objetivo de ser "imparcial" e "científico". O debate entre o tomista Richard Muller e o van tiliano John Frame a respeito do papel da Teologia no estudo da História é sintomático do consenso que cerca a autonomia epistemológica. Para Muller, "enquanto Sola Scriptura deve ser a doutrina capital em matérias de fé e vida, ela não impõe um princípio que pode ser aplicado à historiografia". Para Muller, neutralidade não é apenas possível, mas normativa: "A Historiografia não pode ser baseada em premissas teológicas." R. J. Rushdoony escreveu dois livros demonstrando as conclusões absurdas e anti-cristãs que a posição de Muller implica (v. "The Biblical Philosophy of History"). Importa perceber que o tomista tem duas fontes em sua epistemologia. Deus e a Escritura são norteadores de sua vida espiritual; a razão autônoma é a fonte de sua vida enquanto historiador. Deus e a Escritura são anulados quando ele começa a estudar História. Ele é um cristão em casa e um agnóstico no trabalho.


Mas a posição agnóstica não é neutra. Ela é necessariamente baseada em uma afirmação apriorística: o agnóstico tem conhecimento de seu próprio estado, i.e., seu próprio agnosticismo. O agnóstico não pode clamar ceticismo absoluto. Se ele rejeita a Revelação de Deus, significa que ele sabe alguma coisa que o coloca em posição de rejeitar a Revelação de Deus como fonte de conhecimento. Nas palavras de Greg Bahnsen, "ele só pode fazer um julgamento negativo se ele já se preparou para afirmar algo positivamente". A autonomia epistemológica depende da rejeição da Revelação, necessariamente.


Acreditar que o ser humano deve fazer historiografia sem Teologia é trabalhar contra o Reino. Deveria ser evidente que a Revelação não se resume apenas ao aspecto espiritual. A Escritura não é apenas uma lista de regras. A Escritura, em si, revela a história da humanidade. A Revelação tem absolutamente tudo a ver com a história humana. 


Se um historiador não aceita a autoridade da Revelação, ele não pode atribuir qualquer assassinato ao pecado original. Nenhum movimento histórico pode ser visto como rebelião contra Deus. Nenhum acontecimento conduz a algo. Não há providência divina, ou julgamento. Mas Paulo, em Romanos 1, afirma que a percepção da providência divina e do julgamento divino são precisamente alguns dos elementos pelos quais o homem descrente testemunham a existência e o caráter de Deus. 


Mas Paulo afirma que o homem guarda essas verdades em injustiça. Ou seja, ele atribui a (verdadeira) revelação natural a coisas outras, em sua idolatria. Se houve chuva, o descrente não reconhece nessa benção a Graça de Deus, mas o favor de algum outro deus pagão, ou atribuem-na à pura sorte. Paulo debateu com os epicureus, que não acreditavam em Providência Divina, mas no "acaso". E Muller, e todos os historiadores supostamente "neutros", precisam assumir o "acaso" para os aparentes acidentes na história. 


Ao rejeitar a Sola Scriptura como fundamento para toda a realidade e seu estudo, Muller está na verdade ajudando o ateu a fugir da revelação de Deus na história.


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